Texto publicado originalmente em: https://ligadonapsique1.blogspot.com/
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Resumo:
O objetivo geral desta carta pedagógica é discutir teoricamente os desdobramentos da questão agrária na existência da população indígena Yanomami. Para tanto, fez-se pesquisa bibliográfica em plataformas digitais e livros, a fim de reunir argumentos teórico-científicos na tentativa de responder duas questões básicas:
- Qual a relação entre a questão agrária brasileira e as insistentes invasões territoriais em espaços geográficos indígenas?
- Por que os seres humanos se autodestroem nas relações sociais, mantendo em sua prática ações violentas sobre culturas diversas? Esta carta pedagógica auxilia na ampliação das reflexões acerca de processos libertadores da humanidade, cuja força vem do coletivo, numa práxis freiriana. Abre espaços de diálogo com a materialidade histórica dos homens e suas consciências, cujo objetivo é a libertação de suas mentes e a reapropriação de seu arcabouço histórico-cultural e de sua produção material.
Palavras-chaves:
Reforma Agrária; Etnia; História e Sociedade; Capitalismo Dependente; Práxis Freiriana.
INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO
Nos recônditos do espírito escrevi versos que me pesaram, outros que me confrontaram e outros que me
libertaram. Todos eles eram caminhos possíveis. (Dâmaris Melgaço) Dou início a esta carta pedagógica enfatizando a frase acima citada, a mim – muito peculiar. Afinal, discursar sobre as diferenças é sempre uma possibilidade reflexiva, sendo também uma oportunidade de levar outros seres a trilharem o caminho da reflexão, bem como uma oportunidade de nos concatenar a Paulo Freire em “A Pedagogia do Oprimido” quando afirmava que:
Será na sua convivência com os oprimidos, sabendo-se também um deles – somente a um nível diferente de percepção da realidade -, que poderá compreender as formas de ser e comportar-se dos oprimidos, que refletem, em momentos diversos, a estrutura da dominação. (Freire, 2021, p.67).
É sabido, caro leitor, que desde a transição governamental brasileira ocorrida em janeiro de 2023 – na gestão Lula/Alckmin -, emergiram na mídia casos de exploração do garimpo em terras indígenas Yanomamis, sendo estas questões, já; anteriormente dadas e denunciadas, porém não consideradas em maior ângulo na política de base ultraliberal bolsonarista. Juntos ao caminhante da obviedade, podemos refletir que a questão agrária – aqui exposta -, está para além das políticas de interesses partidários. Ela se alicerça nas bases estruturais da sociedade brasileira, que determinam nossas condições culturais, sociais, políticas e econômicas, não isentando nenhum governo.
Notícias anteriores aos movimentos do novo governo davam conta de que em abril de 2022, uma mulher e uma criança de três anos haviam sido levados por garimpeiros, ficando a criança na posse dos agressores. Outra notícia expôs um vídeo, cuja denúncia apontava o senador Messias de Jesus como um militante do garimpo ilegal e da mineração em terras indígenas, fechando os olhos para os embates mortais existentes entre garimpeiros e indígenas . Fato é, que embora tenham sido feitas denúncias aos órgãos competentes – Polícia Federal e Ministério Público Federal – nada pôde ser feito, pois o local, cuja ocorrência efetuou-se, estava vazio e destruído por chamas. Quando em contato com os indígenas sobreviventes, nada se pôde obter, pois os mesmos foram silenciados por uma boa quantia. O silenciamento dos inocentes, amigo leitor, é a arma fatídica de sua morte.
Relatórios realizados pelo CIMI – Conselho Indigenista Missionário – apontam que no período de 1995 a 2005 ocorreram 287 assassinatos de indígenas no Brasil, sendo 165 no governo FHC – Fernando Henrique Cardoso (1995/2002) – média de 20,65 por ano e 122 no governo de Lula (2003-2005) – média de 40,67 por ano. O relatório, divulgado pelo CIMI em 2022, expõe claramente aumento das violências contra povos indígenas no governo Bolsonaro (2019-2022), contabilizando – em 2021 – 355 casos de violências contra eles, sendo destas; 176 casos de assassinato. Este relatório clarifica a posição mais radical deste governo em 2021, cuja política foi a manutenção da estagnação de demarcações territoriais indígenas e de omissão protetiva às terras já demarcadas. “A consequência dessa postura foi o aumento, pelo sexto ano consecutivo, (grifo meu) dos casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio”” (CIMI, 2022, p. 8). O que denota que esta política já vêm de anos anteriores, porém atualmente mais agravada.
“Embora esse alto índice de violência seja resultante de uma somatória de vários fatores, é sem sombra de dúvidas a questão fundiária a causa principal. A Política Indigenista Brasileira sempre atrelou a demarcação de terras indígenas aos interesses de terceiros sobre as terras e as riquezas nelas existentes.”. (Feitosa, 2006, p. 13). |
A partir dessas reflexões, quero eu tornar esta conversa dialógica, abordando algumas questões importantes e; que – a meu ver -, devem ser discutidas no atual cenário social, econômico e político no Brasil, sendo uma delas a relação entre a questão agrária brasileira e as insistentes invasões territoriais em espaços geográficos indígenas, para uma maior exploração das fontes naturais existentes nessas áreas. Esse convite à reflexão, torna-nos companheiros na exploração dinâmica das variáveis que determinam esses processos e; é claro, não o faremos sozinhos, mas acompanhados por outros pensadores, que há muito tem se debruçado na busca do desvelamento dos fenômenos sociais aparentes. Um deles é o pesquisador Florestan Fernandes (1920-1995), que se dedicou a estudar o processo da revolução burguesa no Brasil, respeitando os aportes históricos e sociais, que embasam as estruturas econômicas brasileiras e que determinam o tipo de capitalismo regente por aqui: o capitalismo dependente Não podemos nos esquecer que o Brasil teve a sua gênese sobre os princípios da contrarreforma e da exploração de novas terras, matriz portuguesa. O período colonial/escravista e; depois, o período republicano deram as bases da exploração pré-capitalista. O Brasil já nutria dentro de si a cultura da exploração e subserviência, que alimentava algumas famílias abastadas, sendo estas, o gene da oligarquia de interesses. Como caminhantes da obviedade, podemos compreender que até a ocorrência dos movimentos de industrialização tardia, ocorrida nos anos 50, o Brasil era uma nação, cuja matriz era rural ou campesina (Fernandes, 2006).
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Dâmaris Alcídia da Costa Melgaçoi,
Faculdade de Educação da Unicamp
Palavras-chave: pedagogia, carta, indígena, YANOMAMI, agrária