SEMINÁRIOS DE ESTUDOS
OS INTELECTUAIS E A EDUCAÇÃO

2009 - GRAMSCI E A EDUCAÇÃO

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APRESENTAÇÃO

O Departamento de Filosofia e História da Educação, da Faculdade de Educação da UNICAMP, através do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação – PAIDÉIA e do Grupo de Estudos e Pesquisas História, Sociedade e Educação no Brasil – HISTEDBR, com o Projeto “Seminários de Estudos – Os intelectuais e a educação”, pretende contribuir para uma reflexão sobre o papel do intelectual na produção de uma reflexão que busque compreender a vinculação dos fenômenos educativos à realidade na qual estamos inseridos, compreendendo o conhecimento como forma de emancipação humana e a educação como estratégia para a construção de uma nova ordem, social, econômica e política.

A cada edição dos Seminários buscaremos a participação dos mais expressivos pesquisadores e estudiosos da vida e da obra do autor, militante ou intelectual homenageado, abrindo, também, espaço para que os estudantes do Programa possam dar suas contribuições.

Para dar início ao Projeto, neste ano de 2009, escolhemos o intelectual italiano Antonio Gramsci (1891–1937), o Nino, que na Sardenha sonhara tornar-se professor de língua e literatura italiana, em uma escola secundária, e que em Turim, certamente pensara na possibilidade de uma carreira como catedrático universitário e linguista.

E não se trata de mera preferência subjetiva. Gramsci talvez seja o marxista “clássico” que mais longe levou a reflexão sobre a escola. Nas milhares de páginas dos Cadernos do Cárcere repousa uma vigorosa reflexão sobre a escola, a educação e a natureza política da cultura.

Com 20 anos foi aprovado em concurso de bolsas de estudos para estudantes pobres do Colégio Carlo Alberto de Turim, inscrevendo-se no curso de letras, com concentração na área de linguística, na Faculdade de Letras da Universidade de Turim. Nessa época já organizava cadernos com suas reflexões, classificadas por temas.

Aos 23 anos passou a militar na Federação Juvenil Socialista (FGS), dedicando-se sobretudo à educação de jovens operários. Assiste um curso sobre o marxismo e aprende a ler em alemão para aprofundar e sistematizar seu estudo.

Em 1915, devido à fragilidade de sua saúde e em função das crescentes dificuldades econômicas, abandona os estudos superiores, sem os concluir. Mas, sob o influxo do movimento operário, abraça com paixão o jornalismo político e a militância socialista. Passa a escrever, com maior frequência, para a página turinesa do “Avanti !” e para o semanário “O grito do povo”.

Como jornalista escrevia sobre teatro, crônicas e política. Os artigos eram breves (uns 2 mil toques), com muitas alusões eruditas, de sintaxe simples e direta. Eram críticas plenas de referências históricas. Defendia a importância da cultura na propaganda socialista, a luta social para o fortalecimento da consciência operária, e o inevitável crescimento do capitalismo e das diferenças entre o Norte e o Sul devido à guerra.

Na sua efervescente época, proferia conferências em Círculos Operários, sobre a Revolução Francesa, a Comuna de Paris, o feminismo, a ópera, o teatro etc.

Em 1916, com 25 anos, foi liberado do serviço militar, por problemas de saúde.

Em 1917 publica o jornal–opúsculo ‘A cidade futura’, de 4 páginas, parte da campanha de recrutamento da FGS. Em setembro, após a prisão de praticamente todos os dirigentes socialistas regionais, tornou-se Secretário da Comissão Executiva Provisória que dirigiu regionalmente o PSI. Foi nomeado diretor e único redator do semanário ‘O grito do povo’, onde publicou artigos de Lênin, Trotsky, Romain Roland e John Reed.

Até 1919 Gramsci ainda era pouco conhecido no mundo do socialismo. Mas, a partir desse ano, passaria a desempenhar papel fundamental nos movimentos populares e sindicais:

  • § Em abril desenvolveu forte agitação entre os soldados de origem sarda, enviados a Turim para reprimir o movimento operário;
  • § Em 1.º de maio, com Tasca, Terracini e Togliatti, antigos militantes universitários da FGS, funda um periódico de política e cultura – “A Ordem Nova”;
  • § Em meados do ano é eleito para a Comissão Executiva da seção de Turim (a cidade vermelha) do Partido Socialista Italiano;
  • § Em junho, em artigo intitulado “Democracia operária” defende a transformação das ‘Comissões internas’ em ‘Conselhos de fábricas’. As comissões eram eleitas exclusivamente pelos trabalhadores sindicalizados, o conselho devia surgir da escolha de todos os trabalhadores;
  • § Em setembro, 2 mil operários da Fiat-Brevetti elegem o primeiro ‘Conselho de Fábrica’. No fim de 1919, mais de 150 mil operários haviam nomeado representantes, segundo as sugestões da “Ordem Nova”.

Os debates sobre os conselhos projetam nacionalmente Gramsci e o semanário ‘A Ordem Nova’, mas também contribuem para dividir a esquerda italiana. A esquerda bordiguista, o centro serratiano e os dirigentes sindicais socialistas viam na proposta dos conselhos o renascimento do anarco-sindicalismo e a ameaça à autoridade dos Sindicatos.

Em 1921, em Livorno, deu-se a cisão do Partido Socialista Italiano e a primeira reunião do Partido Comunista Italiano (PCI). Gramsci considerou a cisão uma derrota, porque o PSI conseguira manter boa parte da vanguarda operária e, sobretudo, porque essa divisão favoreceria a ascensão do fascismo. Trotsky escreveria, em 1932, que apenas Gramsci sentira, realmente, o perigo da ‘Ditadura Fascista’.

Em novembro de 1926 leis fascistas impõem ditadura sobre a Itália e Gramsci, deputado e secretário geral do PCI, é preso a mando de Mussolini. Em 1928 é condenado a 20 anos, 4 meses e 5 dias de prisão. Em 1932 tem sua pena reduzida para 12 anos e 4 meses.

No cárcere passa a refletir sobre a política para uma época de profundo refluxo do movimento operário e social. Essa reflexão foi registrada entre fevereiro de 1929 e agosto de 1935, e resultaria na produção de 33 cadernos escritos simultaneamente e divididos por argumentos temáticos, com um total de 2.848 páginas de texto e de notas, que se encontram hoje depositados na Fundação Instituto Gramsci, em Roma.

Gramsci contou com grande número de livros para redigir seus Cadernos do Cárcere, enviados pela sobretudo pela cunhada Tatiana Schucht. Ele também explorou, exaustivamente, as bibliotecas dos cárceres onde esteve.

Entre as várias questões que se propunha estudar, encontrava-se a questão dos intelectuais. Ele sentia de maneira candente a insuficiência da fraseologia esquerdista e dogmática que penetrara o Partido. Gramsci percebia a inconsistência de concepções que, como dizia, confundiam as ‘palavras com a ação’.

As reflexões registradas em 29 dos 33 Cadernos (4 contêm exercícios de tradução) destinavam-se sobretudo a apoiar o desenvolvimento dos quadros e dos ‘intelectuais’ ligados à classe trabalhadora que constituiriam o futuro grupo dirigente. Para Gramsci o intelectual do partido novo deve ser o vetor da cultura das classes em ascensão, construindo a nova hegemonia através da educação e da organização social.

Em 1934 Gramsci, devido a seu estado precário de saúde, recebe liberdade condicional a ser gozada em clínica. Morre em 27 de abril de 1937, aos 46 anos de idade.

Gramsci não logrou organizar e reordenar seus registros. Não há, portanto, homogeneidade, linearidade ou coerência perfeita na reflexão gramsciana, o que contribuiu para produzir interpretações não raro contrapostas e um debate que prossegue ainda hoje.

Em 1947 a editora Einaudi, de Turim, publica a correspondência Gramsci-Tatiana, sob o título Cartas do Cárcere, organizada por temas e sem as cartas de Tatiana e sem as cartas e trechos que comprometiam Togliatti e a direção do PCI e da Internacional. Entre 1948 e 1951 publica os Cadernos do Cárcere, em 6 volumes, organizados por temas aglutinadores.

Em 1975, a mesma editora apresenta uma edição crítica, em 4 volumes, preparada por Valentino Gerratana, que abandona a ordem temática e apresenta os textos segundo a ordem cronológica da redação. Em 1977 a editora Riuniti, próxima ao PCI, relança a edição temática com os comentários contidos na edição crítica, registrando o número do caderno do qual foi extraído cada comentário.

As referências às questões educacionais e à escola são freqüentes nos Cadernos, mas Gramsci consagrou para esse tema um Caderno especial, o de n.12, que se completa com a leitura do Caderno n.22 (Americanismo e Fordismo) e do n.11 (Introdução à Filosofia) que contribuem para melhor fundamentar sua conceituação da Escola Unitária.

Mas a influência de Gramsci não se limita à Itália. Suas concepções são discutidas por toda parte e influenciam todos aqueles que lutam por uma renovação democrática da educação, da cultura e da sociedade.

No Brasil, o primeiro espaço institucional que se abriu para o estudo sistemático da obra de Gramsci, no campo da educação, ocorreu no primeiro semestre de 1978, com a 1.ª turma de doutorado em ‘Filosofia da Educação’ da PUC-SP, com a disciplina ‘Teoria da Educação’, assumida, a pedido dos alunos, por Dermeval Saviani, que organizou sua programação em torno da obra de Gramsci: “O objetivo era estudar Gramsci para ver em que medida suas reflexões nos ajudam a compreender melhor os problemas que estamos enfrentando na educação brasileira”.

Desta data até hoje inúmeros pesquisadores brasileiros detiveram-se na interlocução de Gramsci com a educação. Nosso objetivo, ao reuní-los neste Seminário, é, a partir de suas contribuições, melhor entender os problemas que estamos enfrentando na educação brasileira, em sua contraditória atualidade.





Prof. Ms. Carlos Roberto Paiva

Prof. Dr. César Apareciddo Nunes