Última alteração: 2016-06-08
Resumo
Esta comunicação tem por objetivo apresentar os resultados finais das reflexões de uma pesquisa dissertativa acerca da infância marginalizada. O objeto e a fonte de investigação foi a obra cinematográfica Pixote, a lei do mais fraco, de 1980, dirigida por Hector Babenco no final da ditadura brasileira (1964-1985). O referencial teórico-metodológico, que subsidiou e norteou as análises, ancorou-se nas categorias do pensamento foucaulteano. A análise das fontes contribuiu para que pudéssemos entender como se davam as práticas de governo da infância marginalizada nos reformatórios e nos grandes centros urbanos do Brasil durante os anos de 1980. A pesquisa desenvolveu-se a partir da análise das imagens fílmicas presentes na obra cinematográfica citada, de reportagens jornalísticas da imprensa escrita e de pareceres técnicos da censura militar, produzidos no momento do lançamento da película, que nos permitiram perceber as práticas de governo sobre a infância, ao mesmo tempo, favorecendo nosso acesso aos meandros históricos do contexto ditatorial brasileiro. Do ponto de vista historiográfico há uma prevalência em preservar a memória daqueles que estiveram no chamado engajamento político contra os militares. Contudo, o objetivo desse trabalho foi justamente problematizar as crianças marginalizadas desse contexto. Infâncias submetidas a práticas exacerbadas de poder e disciplinar, que também resistiam ao processo histórico por meio de contrapoderes, como tática de sobrevivência e luta em face às opressões. Enfim, a pesquisa proporcionou um entendimento acerca do uso estratégico da infância marginalizada, uma vez que a partir das crianças “marginais” se deu a elaboração e o aprimoramento de todo um aparato disciplinar e de governo das crianças, com dispositivos eficientes, realizando-se no campo jurídico, policial, discursivo e pedagógico. Notou-se que no entorno das crianças marginalizadas forjava-se mecanismos eficientes de controle social, que não se restringiam tão somente a tais indivíduos, mas que também se estendiam a todo corpo social infantil, porquanto por meio do sistema binário é que se constituíam os padrões de normalidade. Isto é, a criança anormal servia como espelho ou ponto de partida para a constituição dos parâmetros de normalidade infantil. As fontes visuais e, principalmente, a documentação escrita deste trabalho foram fundamentais para inferir, que no contexto da década de 1980, existia de modo disseminado na sociedade e na imprensa brasileira, um conjunto de práticas discursivas que colaboravam para ressignificar a identidade dos pequenos marginalizados, bem como favoreciam para reafirmar imagens dos delinquentes infantis. Sendo, portanto, possível asseverar que a imprensa e o filme Pixote funcionaram como dispositivos de construção dos patrões anormais infantis com vistas a servir de contraponto para a fabricação de uma infância normatizada. Nos anos de 1980, a produção, a exibição e a repercussão da obra cinematográfica Pixote, a lei de mais fraco de Hector Babenco pode ser vista como uma prática social que corroborou para exercícios de governo das crianças marginalizadas, resultando na normatização do corpo social infantil.