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Pâmela Suelen Gama da Cruz | Atualizado em 15/06/2021 - 13:34 FE Publica

De Marielle Franco a Cleonice Gonçalves e Miguel: a interseccionalidade como ferramenta analítica na elaboração de políticas públicas efetivas

INTRODUÇÃO

A cultura brasileira é popular em todos os continentes, seja através do futebol, samba, carnaval ou da beleza das mulheres[1]. A caricatura de nosso país conta com seu colorismo, bom humor, improviso e festa, muita festa. O que faz com que se torne um dos destinos mais procurados de dezembro ao carnaval, seu clima tropical chama a atenção de estrangeiros, lotando as praias, bares e boates. Não por acaso que o famoso réveillon de copacabana bateu seu recorde[2] neste ano, abrindo alas para números históricos no carnaval brasileiro[3].

O antropólogo carioca Roberto DaMatta é conhecido por suas produções acerca do jeitinho  brasileiro,  contudo,  suas  análises  apontam  que  a  nossa  história  possui inúmeras raízes, tão diversas quanto às nacionalidades dos colonizadores do Brasil de 1500. Portanto, estudar sobre esse contexto com o intuito de encontrar um único caminho, seria ineficiente. O antropólogo sinaliza a importância que o espaço e tempo tem para a compreensão das realidades brasileiras (DAMATTA, 1986). Sim, no plural. As terras tupis e guaranis foram marcadas por questões sociais, culturais, econômicas, cor, gênero, idade, capacitismo e, desse modo, conclui-se que a busca por uma única versão é utópica, haja visto que cada uma dessas questões são singulares.

Enquanto celebrava-se a chegada do novo ano, entusiasmados com abraços calorosos, risos compartilhados, aglomerações desejadas e o (re)encontro com pessoas de muitas partes do mundo, não poderíamos imaginar que outro fenômeno também iria unir tantas identidades, mas de um modo completamente diferente, retirando de nós o que nos unia: abraços, apertos de mão, comemorações, reuniões, praias, parques, shoppings, comércio, viagens, escolas e universidades. Em meados de dezembro de 2019, na cidade de Wuhan na China, diversos casos aparentemente parecidos com pneumonia foram notificados, o crescente número de ocorrências alertou a capital e entre 31 de dezembro de 2019 a 05 de janeiro de 2020, os chineses debruçaram-se na descoberta da origem do fenômeno que se espalhava.

Em  7  de  janeiro,  a  China  notificou  a  origem  da  pseudo-pneumonia:  uma  nova formação do coronavírus[4] denominada SARS-CoV-2 (PORCIDES, 2020). Considerado um vírus altamente transmissível por vias respiratórias, superfícies contaminadas, apertos de mão e com o quadro sintomático de tosse, febre, dificuldade para respirar, anosmia, dispnéia, astenia, vômito e ageusia. Ainda assim, o covid-19 também gera casos assintomáticos, dependendo diretamente do organismo de cada indivíduo, sua contaminação pode ocasionar quadro respiratório agudo - motivo declarado em diversos casos -, o que acarretou grande demanda por ventiladores pulmonares em todo o planeta, assim como produtos para uso diário (álcool em gel, máscara, sabonete líquido, termômetros).

Em 9 de janeiro, o mundo registra a sua primeira morte pelo vírus, a partir de então os números crescem exponencialmente em diversos países: Tailândia, Japão, Coréia do Sul, Estados Unidos. Em 25 de fevereiro, os noticiários relatam que o covid-19 chega em terras brasileiras através de um vôo vindo da Itália, onde um senhor teria sido contaminado. A Organização Mundial da Saúde (OMS) declara o coronavírus como pandemia em dia 11 de março de 2020 (SAÚDE, 2020; PORCIDES, 2020). No intervalo de seis dias, Cleonice Gonçalves, mulher carioca, negra, diarista, mãe, tia, hipertensa e diabética veio a óbito em 17 de março de 2020 após ser contaminada em seu local de trabalho: um apartamento no Alto Leblon, considerado o metro quadrado mais caro do país. Logo após a sua morte, a patroa de Cleonice teve o teste de covid-19 confirmado, a contaminação ocorreu devido a viagem realizada para a Itália dias antes (MELO, 2020).

O óbito de Cleonice foi uma das primeiras notificações de vítimas do coronavírus, sendo, portanto, noticiada em todos os meios de comunicação e gerando debates importantes. Para além da sinalização de uma possível contaminação comunitária caso medidas protetivas não fossem elaboradas pelo Ministério da Saúde, Cleonice trouxe a realidade de modo nu e cru para nós: a desigualdade. Embora o covid-19 não escolha a sua vítima considerando suas características sociais, econômicas e culturais, pode-se perceber que a governamentalidade de um país está intrinsecamente ligada aos riscos de contaminação, o que vem a criar um novo quadro de estatísticas das vítimas: os marcadores sociais.

A denominação de “marcador” não nos aparece sem origem, mas sim após uma longa reflexão acerca de uma nomenclatura que pudesse dar conta sobre dados tão importantes. De acordo com o dicionário Oxford Languages, entende-se por “marcar + dor; quem ou o que marca; indivíduo que marca objetos com propósitos comerciais ou industriais; máquina ou aparelho que faz esse serviço; placar; em esportes coletivos, indivíduo que marca o adversário, para dificultar-lhe ou impedir-lhe as jogadas; tira ou fita presa à lombada de um livro para marcar a página desejada”.

Dessarte, os marcadores sociais são as impressões que a sociedade assinala em cada cidadão e em muitos casos podendo ocorrer uma interdependência entre eles, pois quanto mais pontos o indivíduo (homem branco) marcar em seu adversário (qualquer sujeito não-branco), mais ele irá dificultar a sua jogada ou poderíamos dizer vida? Causa-se a dor no outro ao marcá-lo com algo que irá persegui-lo em toda a sua trajetória, fazendo com que seja visto como uma espécie de derrota. E por qual motivo ocorreria a necessidade do marcador senão para manter o homem branco em seu pódio, dando a ele todo o poder comercial, industrial, civil e humano?

Embora autores como Federici (2017) e Estanque (2008) tenham realizado esplêndidos trabalhos acerca da visão marxista sobre o impacto da transição do feudalismo para o capitalismo, no presente trabalho iremos para além da classe social e seu aspecto econômico, pois as desigualdades possuem estruturas complexas e interseccionais, criando um cenário excludente e explorador ao utilizar as diferenças como fontes de embasamento essencialista. Como bem dissertado por Estanque (2008) as desigualdades vão além da distribuição - muitas vezes desigual - de bens materiais, o outro lado da moeda nos mostra recursos culturais, sociais e educacionais são aspectos imateriais. A colonização trouxe consigo lendas ontológicas baseadas na cor, gênero, capacitismo, nacionalidade e classe, desse modo:

A valorização do corpo deve mesmo ser ligada ao processo de crescimento e de estabelecimento da hegemonia burguesa; mas não devido ao valor mercantil alcançado pela força de trabalho, e sim pelo que podia representar política, econômica e também historicamente, para o presente e para o futuro da burguesia, a “cultura”do seu próprio corpo (FOUCAULT, 2017, p. 136)

 

O modelo universal coloca no pódio o corpo de um homem, branco, classe média-alta, capacitado e europeu, onde qualquer indivíduo que não se situe nesta composição é marcado por suas diferenças. A partir do século XVIII, o homem do ocidente começa a perceber-se como espécie e para manter a sua descendência é necessário “ter um corpo, condições de existência, probabilidade de vida, saúde individual e coletiva, forças que se podem modificar, e um espaço em que se pode reparti-las de modo ótimo. Pela primeira vez na história, sem dúvida, o biológico reflete no político” (FOUCAULT, 2017, p. 154). Portanto, por meio de uma biopolítica da população[5] que possui em seu âmago a administração dos corpos através da elaboração de políticas públicas que forneçam ou não aspectos imateriais como educação, habitação, saúde, trabalho, saneamento básico etc.

A morte de Cleonice não foi causada apenas por um vírus, pois devemos considerar as conta as condições de vida que a mesma possuía e que a mantinha com a necessidade de ter de trabalhar mesmo estando altamente exposta a transmissão. Ter o direito de saúde e segurança retirados ao precisar trabalhar para sustentar a família em meio a uma pandemia, onde atores políticos decidem se deve haver ou não o isolamento social[6], enquanto diversas pessoas correm risco de vida. As mães[7] acabam precisando levar seus filhos ao trabalho - pois as escolas permanecem fechadas e não tem com quem deixá-lo -, para ter de passear com os cachorros da patroa enquanto seu filho fica sob os cuidados da mesma e acaba caindo do nono andar de um prédio de luxo em Recife (PE) ao ser deixado sozinho. O Caso Miguel[8] evidencia a desigualdade social, de forma a mostrar que enquanto alguns têm de trabalhar e colocar a vida de sua família em risco, outros podem ser acusados de homicídio culposo e pagar a fiança de 20 mil reais em troca de sua soltura.

A mãe de Miguel, Mirtes Renata Santana de Souza e a morte de Cleonice Gonçalves nos mostram o quanto a biopolítica baseia-se no deixar morrer e fazer viver, pois embora o direito à saúde e segurança sejam resguardados na Constituição Federal, a administração dos corpos ocorre através das diferenças: Mirtes e Cleonice são mulheres de cor, empregadas domésticas, mães de classe média. E para a realização de uma análise faça jus a ambas realidades é necessário averiguar o quanto a realidade de Mirtes e Cleonice possuíam distintos marcadores sociais que se interseccionam.

O presente cenário escancarou a realidade de que embora todos devam estar resguardados pela lei, o Estado não chega na classe baixa e, consequentemente, os cidadãos têm de dar o jeitinho brasileiro de sobreviver. O antropólogo DaMatta (1984) ao realizar diversos trabalhos acerca desse hábito brasileiro, pontuou que na história da política brasileira o Estado nunca foi imparcial às realidades existentes em nosso país, pelo contrário, sempre tendeu a beneficiar a elite[9]. Portanto, o jeitinho brasileiro se faz necessário devido a não garantia dos direitos, pois de um lado temos um cidadão que possui dificuldades e demanda auxílio do Estado e por outro possui um governo que interdita esse pedido, colocando-o para debaixo do tapete. O jeitinho brasileiro muitas vezes faz-se necessário para a sobrevivência daqueles abandonados por sua própria nação, é estar entre a cruz e a espada ao ter de decidir se trabalha para pagar as contas mesmo estando expostos a um vírus fatal ou permanecer em casa sem sustento em prol da proteção de si e de sua família.

Frente a isso, o presente artigo contará com a ferramenta da interseccionalidade (CRENSHAW, 1989; BRAH, 2006; COLLINS, 2015) utilizado pelas feministas negras, bem como o conceito de biopolítica e governamentalidade do filósofo francês Michel Foucault (2008, 2010, 2017). Tais autores fornecem conceitos importantes para a reflexão sobre política públicas que, embora sejam declaradas sob a idealização de uma igualdade, são ferreamente encobertas pela supremacia patriarcal, branca, rica, heteronormativa e capacitista.

 

“BRASIL ACIMA DE TUDO, DEUS ACIMA DE TODOS”

 

Não haveria a possibilidade de debater sobre o atual cenário político brasileiro sem falarmos de história. Portanto, convido os leitores a questionarem-se sobre a narrativa contada pelos seus antigos professores ao ministrarem a aula sobre o “descobrimento[10]  do Brasil delineado por Pedro Álvares de Cabral em 1500 (GOMES & ROCHA, 2016). A descrição dos portugueses conta que ao ancorar seus barcos em terras brasílicas, descobriram diversos grupos que andavam nus, viviam em mata fechada e tinham costumes estranhos, alguns deles eram considerados extremamente perigosos e alimentavam-se de carne humana, mais conhecidos como canibais. Esta é a versão que contém nos livros de história e são ensinados para todos os cidadãos que tiveram acesso à escola.

Contudo, aprendemos a narrativa colonial e não daqueles que foram colonizados. O exercício foucaultiano consiste em desenterrar as demais versões que foram desconsideradas, colocando-nos em uma única versão considerada a universal e, portanto, verdadeira. Em 2009, a nigeriana feminista Chimamanda Ngozi Adichie participou da série de conferências denominada “Technology, Entertainment, Design”, mais conhecida como TED Talks. O título de sua apresentação “o perigo de uma história única” é autoexplicativo e sua repercussão foi tão grande que o discurso foi transcrito e publicado em livro. Nele, Adichie (2019) relata a transição de seu período escolar até a faculdade e as histórias que ela ouvia e lia sobre a África – também contada pelos colonizadores –, em suas relações pessoais, as pessoas já possuíam uma ideia pré-concebida de Chimamanda, antes mesmo de conhecê-la, devido à história em que colocam os africanos enquanto inferiores, bem distintos da população branca ocidental.

A história contada por Adichie (2019) é compatível com o trabalho realizado por Gomes e Rocha (2016)

 

O Brasil não existia em 1500, existia uma porção de terra, já povoada por seus habitantes nativos, batizados de índios somente porque os europeus pensavam terem chegado à Índia, e muitos caminhos podiam ser tomados ali, mas o que temos hoje é o resultado do que foi feito nesse período, mas com mudanças no passar do tempo, pois “toda história é contemporânea”, afinal está sempre a ser interpretada com leituras contemporâneas, compreendendo o passado com uma leitura renovada. De início, essa descoberta – que na verdade já não era descoberta, pois a terra já estava habitada (p. 96)

 

O trecho anterior tem o intuito de analisar o esvaziamento da cultura indígena causado pela colonização, deixando-nos sem relatos que possam mostrar o outro lado da história. O encontro de duas culturas – portugueses de um lado e incas/tupis de outro – foi conflituoso durante anos, para além da inexistência de um idioma em comum e a diversidade de dialetos nas aldeias, os costumes indígenas como a nudez, nomadismo, antropofagia, poligamia eram completamente opostas a realidade europeia.

Há 520 anos a construção da história do Brasil conta com a elite latifundiária escravista que representava a principal força política, fazendo-nos pensar que “os homens brancos faziam e executavam as leis e políticas de seu próprio interesse” (MCCLINTOCK, 2010, p. 22). O conto do “descobrimento do Brasil” pressupõe que os ameríndios que aqui viviam precisavam de salvação e o seu Deus branco, barbudo e salvador chegaria junto às Grandes Navegações, não é a toa que o Padre José de Anchieta utiliza do ensino religioso e da moral cristã para dominar os povos nativos (PISNITCHENKO, 2004). Através do mito de que o Deus salvador perdoa os pecados de seus fiéis deu-se a construção de uma sociedade estruturalmente racista, defendendo seus governantes brancos, viris, conservadores, descendentes de europeus e com formação superior, enquanto os filhos da terra brasílica tinham de explorar seu país para o enriquecimento de seus salvadores.

Ao analisar a integração dos negros na sociedade após a abolição da escravatura no Brasil, para além de mostrar a construção da intrínseca relação entre raça e classe, Florestan Fernandes (2008) faz o mito da democracia racial desmoronar ao expor que mesmo após a libertação dos escravos a sociedade mantinha estruturalmente o imaginário social de que os negros de inferioridade, associando a falta de oportunidades para a construção de suas vidas a ideia de competitividade, ou seja, agora o negro liberto poderia competir com o branco. A renúncia das máscaras de flandres e do açoite tampouco poderia ser considerada sinônimo de libertação, haja visto que a sociedade havia engendrado em cada espaço um racismo estrutural (ALMEIDA, 2019) que estava longe de garantir direitos humanos aos negros.

Talvez o jeitinho brasileiro já tivesse dado seus primeiros sinais em um período anterior a Lei Áurea, quando os conflitos entre a coroa portuguesa e a Grã-bretanha se intensificaram e a cobrança pela abolição da escravatura era intensa e nesse momento, o Brasil constitui a tão pouco conhecida Lei Feijó, mais conhecida como “lei para inglês ver” devido ao fato de sequer ter sido levada a sério, servindo apenas de curva de manobra para as exigências inglesas (LIMA, 2019). Contudo, entre 1831 e 1888 o conflito entre os abolicionistas e escravagistas estava em seu limite, a autora também nos pontua que um dos motivos que fez com que a Lei Áurea fosse criada era a contenção das manifestações que ameaçavam causar a desordem no engenho.

Se em terras brasílicas os povos finalmente estavam libertos, do outro lado do continente a Era Vitoriana se levantava com seus valores eugenistas, embebidos de valores morais com o intuito de resguardar a sexualidade somente para o núcleo familiar, controlando a propagação de cidadãos que fugissem do modelo burguês. Em História da Sexualidade I, Foucault (2017) disserta acerca da criação do dispositivo da sexualidade enquanto possibilidade do controle da natalidade e a preocupação que a burguesia tinha com a sua descendência. Portanto, a ideia de raça poderia ter sido criada com o desígnio de justificar cientificamente a inferioridade dos negros (ALMEIDA, 2019), os quais mesmo libertos seriam espremidos por biopolíticas excludentes assentadas em valores de fazer viver ou deixar morrer (FOUCAULT, 2017).

Não mais acorrentados, os negros migraram para diversas cidades em busca de um lugar ao sol, contudo, não sem dificuldades. Abandonados por sua pátria, os libertos tiveram obstáculos para encontrar moradias, trabalhos remunerados, educação e isso levou a uma extensa   aglomeração   de   cortiços[11]    nas  cidades,  especialmente  no  Rio  de  Janeiro. Sem saneamento básico, direito a moradia, educação e trabalho, poderia-se perceber que o Estado não   chega   ao  morro,  demandando  dos  africanos,  brasileiros  e  miscigenados  o  jeitinho brasileiro para sobreviver. Com o passar do tempo, os morros foram considerados favela, lugar sem lei, vagabundagem, degenerados, essa caricatura fora alimentada por toda a sociedade até os dias de hoje (VALLADARES, 2011). Mesmo após a Constituição Brasileira de 1988 e o período de redemocratização após o golpe de 64, os negros tiveram de lutar dia após dia em todos os ambientes, principalmente contra o estigma que os acompanhava: indigentes.

 

DA AVENIDA AOS BECOS: O ESTADO NÃO SOBE O MORRO

 

Embora conste no Artº 5 da Constituição Brasileira de 1988 que todos nós somos iguais perante a lei e que temos direito à segurança, igualdade, liberdade e propriedade (BRASIL, 1988), não é bem assim que as coisas acontecem na prática. De certo modo, o Brasil persiste em manter uma política “para inglês ver” quando, infelizmente, não garante a universalidade de sua Constituição. Ainda que o Brasil tenha declarado a Independência, nossas políticas públicas permanecem com valores europeus, se os brasileiros são conhecidos pelos seus turistas pelo bom humor e hospitalidade, o mesmo não ocorre com seus irmãos da pátria.

Sendo transmitido através do contato humano, o covid-19 demanda de todo o mundo constantes cuidados higiênicos desde a lavagem das mãos até a desinfecção de superfícies de materiais. O kit de proteção álcool em gel, máscara e distanciamento social são necessários até que a ciência consiga encontrar uma fórmula para nos proteger da contaminação. Se por debaixo das avenidas a água está encanada e chega até os grandes prédios das cidades, o mesmo não ocorre com o morro. As favelas vêm enfrentando ano após ano a falta de saneamento básico, em muitas comunidades a escassez de água já é notável e ainda que houvesse, seu tratamento não é adequado e os moradores relatam ter de esquentar a água para utilizá-la[12].

Constantemente somos convocados a preencher formulários com nossos dados pessoais, contato, endereço, documento e cor. Quantas histórias cruzadas cabem entre o branco, o pardo e o negro? Para os países desenvolvidos nós estamos longe de ocupar a posição de brancos, como diria Almeida (2019) somos o “branco periférico” (p. 79) ou então o simples relato de Padovani (2017) que nos faz perceber que somos pardos demais para sermos considerados brancos no norte-americano e na europa, enquanto somos brancos demais para sermos considerados negros em solo brasileiro. Se Padovani (2017) esteve na fronteira entre uma pesquisadora miscigenada em solos americanos, era branca o suficiente para ocupar o outro lado na extensa Amazônia.

Assim como o branco periférico, a nossa Constituição também está entre o branco e o negro. Muitas vezes iludidos pela promessa capitalista de que é possível tornar-se classe alta através de muito esforço, a classe média brasileira começou a apoiar seus patrões com o intuito de poder diferenciar-se do negro, pois “o pavor de um dia ser igualado a um negro é o verdadeiro fardo que carrega o homem branco da periferia” (ALMEIDA, 2019, p. 79). A biopolítica brasileira é realizada no entre com o intuito de separar o branco do periférico, contudo, a proliferação de um vírus altamente transmissível colocou em evidência a separação, fazendo desmoronar o status de Estado democrático. Portanto, Cleonice Gonçalves e Mirtes Renata, mãe de Miguel, não estavam apenas em uma avenida, mas sim no cruzamento de tantas outras, por onde o carro de resgate das políticas públicas, como bem sinalizado pelo atual Presidente da República, Jair Bolsonaro: não podem parar[13].

Se por um lado a classe média e alta permanecem em suas casas garantindo sua segurança, queixando-se de tédio[14], homeschooling e home-office, desejando realizar a sua reserva nas areias das praias cariocas[15], por outro lado muitas Cleonices e Mirtes se vêem expostas ao vírus na superlotação dos transportes públicos durante o trajeto casa/trabalho, bem como suscetíveis a contaminação ao terem de limpar o guarda sol de suas patroas quando as mesmas retornam da praia.

O benefício proposto pelo governo e sancionado pela Lei nº 13.982/2020 (BRASIL, 2020) pode trazer aos brasileiros a visão de uma luz no fim do túnel ao garantir - com demasiada dificuldade - o repasse no valor de seiscentos reais para os cidadãos no decorrer da pandemia, desse modo os interessados poderiam solicitar pelo aplicativo o seu auxílio emergencial. É de suma importância não esquecermos do detalhe de que, não são todos os indivíduos que têm acesso a internet, smartphone e educação. Contudo, ainda que baixo, o valor do auxílio emergencial chega perto do triplo do Programa Bolsa Família[16].

Com as escolas fechadas, muitas famílias estão tendo que permanecer com os seus filhos em tempo integral ao tentar conciliar emprego, trabalho doméstico não-remunerado, escola e saúde, o novo coronavírus também fez com que a desigualdade de gênero ficasse em evidência ao sobrecarregar as mulheres. Para além do ambiente doméstico, as profissões que possui um público majoritariamente feminino estão na linha de frente: enfermeiras, empregadas domésticas, professoras, vendedoras, coletoras de lixo. A dificuldade da vida no espaço público não pode pressupor a segurança na vida privada, pois estudos demonstram que a violência doméstica tem aumentado drasticamente no período da quarentena[17].

 

COM QUANTAS RUAS MARIELLE FRANCO SE FAZ UM CRUZAMENTO?

 

O conceito de interseccionalidade foi cunhado por Kimberlé Crenshaw ao falar acerca da realidade da mulher negra, pois a medida que o feminismo norte-americano e europeu reivindicava os seus direitos ao voto, educação e trabalho, colocando o conceito de gênero em campo, as mulheres negras lutavam pela sua liberdade e humanidade (DAVIS, 2016). O feminismo negro mostra-nos como os marcadores sociais interseccionam entre si, enquanto a mulher luta por seus direitos na avenida do “gênero”, as mulheres negras lutam concomitantemente com o gênero, raça e classe (CRENSHAW, 1989). Notifica-se ainda que, a expressão elaborada por Crenshaw ocorreu devido a discrepância dos direitos humanos e civis nos Estados Unidos em relação às mulheres negras. Desse modo, o direito enquanto campo para a proteção legal do sujeito, acaba por reproduzir e afirmar as diferenças sociais.

Ao falar da transição do poder soberano para a moderna concepção de Estado, Foucault (2008, 2010) desenvolve o conceito de governamentalidade ao discutir sobre o biopoder[18] e seu controle de uma nação, onde através de políticas públicas que fazem viver e deixam morrer, o Estado realiza uma escolha dos locais e grupos onde irá dar suporte, garantindo os seus direitos estabelecidos por lei, em contrapartida, outros locais sofrem defasagem. A estratégia do biopoder estaria baseada no racismo de Estado (FOUCAULT, 2010), designado como a categorização dos indivíduos, delimitando os considerados degenerados, indóceis e perigosos à nação e, portanto, vivem nos quartos de despejo[19] das cidades lutando pela sua sobrevivência enquanto seus irmãos da pátria têm seus direitos resguardados pela lei.

Refletindo sobre a governamentalidade, Gallo (2015, 2017) pontuou as inúmeras artes de governar e embora todas elas busquem manter a paz na sociedade, não necessariamente ela ocorre de modo democrático, dessarte o filósofo cunhou o conceito de governamentalidade democrática no momento em que questionou se seria possível um governo que zelasse a vida de todos os seus cidadãos. Ao mesmo tempo em que Crenshaw (1989) problematiza a defasagem dos direitos civis em solos norte-americanos, outras autoras como Brah (2006), McClintock (2010) e Collins (2015) conclamam o mesmo cenário em suas experiências, levando em conta as devidas nacionalidades. Portanto, a construção dos direitos civis deve levar em conta as múltiplas formas de vivenciar o marcador racial, visto que a mestiçagem faz parte da realidade dos brasileiros (COUTINHO, 2014; CORREIA, 2000).

O caminho delineado até aqui nos traz reflexões acerca do modelo de governamentalidade que vem se dado em solo brasileiro desde a sua invasão. Embora o Brasil seja considerado um país livre hoje em dia, seus valores estão enraizados em uma cultura eurocêntrica, se políticas públicas não forem constantemente revistas de acordo com o contexto estaremos reproduzindo a “lei para inglês ver”. É notável a urgência de um governo democrático que garanta os direitos básicos a todos os seus cidadãos, lutando contra o racismo estrutural que existe em nosso país. Para além de uma liberdade governamental, o Brasil necessita desvencilhar-se de valores eurocêntricos e perceber-se no entre, reconhecendo que a interseccionalidade é uma ferramenta poderosa para a construção de uma governamentalidade democrática que mova montanhas e suba os morros.

A morte de Cleonice Gonçalves e de Miguel nos mostram a emergência de políticas públicas efetivas e que isso só será possível a partir do momento em que houver um olhar interseccional entre os becos por onde os brasileiros passam. Enquanto olharmos para o nosso país com os olhos azuis de nossos colonizadores, continuaremos reproduzindo o genocídio de nosso povo ao termos aversão a nossa própria pátria. Precisamos de políticas públicas que deem conta da diversidade brasileira da serra ao litoral, do rural ao urbano, do morro à avenida, de norte a sul.

Enquanto o Brasil não reconhecer-se enquanto améfica ladina, como diria nossa feminista negra Lélia Gonzalez, continuaremos invisibilizando o nosso povo e envaidecendo o outro lado da fronteira. A deputada Marielle Franco, mulher, negra, lésbica, favelada, feminista e socialista foi brutalmente assassinada em um atentado que disparou treze tiros em seu carro, matando também seu motorista Anderson Pedro Gomes. Hoje, homenageada em muitos lugares do mundo, Marielle permanece tentando fazer justiça mesmo após ter sido assassinada. Seu impacto na política brasileira fazia estremecer políticos de extrema-direita que vem trazendo retrocessos a nossa nação.

Marielle lutava pelos direitos das comunidades, fazendo ponte entre todas as avenidas para que nenhuma vida fosse invisibilizada assim como a sua foi no dia 14 de Março de 2018 na rua Joaquim Palhares no Rio de Janeiro. As políticas públicas e a justiça não passaram e ainda não passam na rua em que Marielle morreu, mas sua luta fortaleceu suas sementes que hoje buscam criar tantas ruas em seu nome. A autora Padovani (2017) relembra-nos bravamente o trabalho de Frantz Fanon acerca da produção de conhecimento ocidental que baseia-se no corpo do homem branco e banaliza o psiquismo do negro ao taxá-los como os “outros”, colocando-os para fora da margem ao desumaniza-los.

Em seu discurso proferido em 1851, Sojourner Truth enfrenta a platéia majoritariamente branca ao questionar “não sou eu uma mulher?” ao contestar os atributos de feminilidade baseados na docilidade, delicadeza e cuidado (GELEDÉS, 2014). A realidade de uma mulher negra escravizada confrontava com o discurso essencialista do que é ser uma mulher, Sojourner não estava na avenida sobre raça, gênero ou classe, mas sim na intersecção de todas elas, mostrando ao feminismo da época a necessidade de incluir tais categorias em suas lutas ou então o feminismo reproduziria todas as suas queixas: se não há um destino pré-estabelecido, por que as interseccionalidades não são consideradas?

Cento e sessenta e nove anos nos separam do discurso de Sojourner Truth, mas através de um pequeno recorte de seu visceral relato onde sinaliza que “eu pari 3 treze filhos e vi a maioria deles ser vendida para a escravidão, e quando eu clamei com a minha dor de mãe, ninguém a não ser Jesus me ouviu! E não sou uma mulher?”, podemos observar que a maternidade da mulher negra ainda é desconsiderada. Quantas Marielles e Cleonices teremos de perder? Quantas Mirtes terão de enterrar seus filhos devido ao descaso do governo? Quantas Mônicas terão de viver com o luto de seus amores? Quantos Miguéis perderão a vida para a burguesia branca?

No início do livro Gênesis podemos observar claramente que Deus precisava mover-se sobre as faces das águas, separando-as e expandindo-as até poder avistar a porção seca de Terra, desejando que a mesma fosse fértil e frutífera, bem como os animais da terra, água e ar. Após materializar o mundo, foi necessário que Deus criasse o homem à sua imagem e semelhança e, posteriormente, a mulher. E seus fiéis teriam de dominar tudo o que se move para que, prontamente, Deus pudesse descansar no sétimo dia.

Didaticamente, Padovani (2017) analisa o conceito de Kimberlé Crenshaw em consonância com a discussão de Carla Akotirene e Anne McClintock, onde

 

Somente alguns sujeitos seriam marcados pelos entrecruzamentos dos eixos. Desde essa produção normativa das interseccionalidades, o homem branco heterossexual, por exemplo, não ocuparia qualquer avenida. Não estaria marcado por nenhum atributo que, na formulação de Crenshaw, mais do que produtor de diferenciação, seria produtor de desigualdades (p. 18)

Seria o Deus todo poderoso o homem branco, europeu, rico? E seríamos nós, os índios e africanos os que deveriam ser salvos? Se Deus criou todas as coisas, quem o criou? Ninguém, ele sempre existiu. Assim como o homem branco heterossexual não é localizado em nenhuma das avenidas, pois “porque esse seria o sujeito da autoria dos mapas das opressões” (PADOVANI, 2017, p. 18), o Deus todo poderoso é ilustrado como universal. A passagem de indivíduo para fiel faz com que o ser humano fique impossibilitado de questionar a onipotência de Deus e do homem, obrigando-o a dizer “amém” para todas as tragédias que o cercam, colocando-o como responsável por seus pecados e vivendo em uma constante renúncia de si mesmo por um “bem maior”. Se em Gênesis,s, o Estado promete a felicidade e estabilidade de seus cidadãos, influenciando-os a não experimentarem o fruto proibido do conhecimento[20] do bem e do mal.

 

Pâmela Suelen Gama da Cruz

Mestranda em Educação (Unicamp)

Psicóloga

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo da história única. Tradução: Júlia Romeu, 1 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. - São Paulo : Sueli Carneiro ; Pólen, 2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm acesso 03 ago. 2020.

BRASIL. Lei nº 13.982, de 2 de Abril de 2020. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para dispor sobre parâmetros adicionais de caracterização da situação de vulnerabilidade social, 2020.

BRAH, Avtar. Diferença, diversidade, diferenciação. Cad. Pagu, Campinas , n. 26, p. 329-376,         2006.                                                 Disponível                           em:

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[1] A objetificação do corpo feminino é demasiadamente presente quando se fala em cultura brasileira, o estereótipo é alimentado pelas produções cinematográficas, propagandas de bebidas alcóolicas e até mesmo na conversa diária entre os brasileiros, bem como os turistas. Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro realizou um infeliz comentário onde dizia acerca do “turismo gay”, sinalizando que os visitantes poderiam sentir-se a vontades para vir até o país transar com as mulheres. Diversas cidades turísticas manifestaram-se dizendo que o espaço estaria disponível para visitação, contudo, o corpo das mulheres não.

[2] Na virada de ano de 2019/2020 o destino carioca recebeu aproximadamente 1,7 milhões de estrangeiros e totalizando quase 3 milhões de pessoas. Ver mais em: https://oglobo.globo.com/rio/rio-tem-recorde-de-turistas-no-reveillon-1… 123

[3] Na virada de ano de 2019/2020 o destino carioca recebeu aproximadamente 1,7 milhões de estrangeiros e totalizando quase 3 milhões de pessoas. Ver mais em: https://oglobo.globo.com/rio/rio-tem-recorde-de-turistas-no-reveillon-1… 123

[4] Na virada de ano de 2019/2020 o destino carioca recebeu aproximadamente 1,7 milhões de estrangeiros e totalizando quase 3 milhões de pessoas. Ver mais em: https://oglobo.globo.com/rio/rio-tem-recorde-de-turistas-no-reveillon-1… 123

[5] Ver mais em Foucault (2017)

[6] Ver mais em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/noticia/2020/04/linha-do-tempo… ro-e-mandetta-na-crise-do-coronavirus-ck935ri4r00ky014q3pa00bq7.html

[7] Nesta reflexão, leva-se em conta o dado de que a responsabilidade do cuidado de sua família recai na maioria das vezes nas mulheres.

[9] Algumas décadas nos separam do trabalho e da observação de Roberto DaMatta, mas ainda podemos observar que o cenário brasileiro continua priorizando a elite. De acordo com um estudo realizado pela ONG OXfam, o patrimônio dos super-ricos aumentou durante a pandemia do coronavírus. Ver mais em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/07/27/patrimonio-dos-super-r… urante-a-pandemia-diz-oxfam.ghtml

[10] Os autores Gomes e Rocha (2016) realizaram uma breve e didática investigação acerca do encontro entre os portugueses e os incas/tupis (habitantes das terras brasílicas antes da exploração realizada por Portugal), desconstruindo o ideal colonizador de que o Brasil havia sido descoberto e não invadido.

[11] O romancista Aluísio Azevedo ilustra o cenário brasileiro do final do século XIX em seu livro O Cortiço, esmiuçando a condição de vida dos brasileiros da época.

[13] Durante diversas coletivas de imprensa, Jair Bolsonaro disse que o novo coronavírus era “superdimensionado”, “gripezinha” e enfatizando que “Não é apenas questão de vida. É a questão de economia também. É a questão do emprego”. Ver mais em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/03/30/bolson… uestao-da-economia-tambem.htm

[14] Importante frisar que o simples fato de podermos expor nossos sentimentos, é um privilégio.

[15] O projeto proposto pelo prefeito Marcelo Crivella (RJ) sugeria a reserva de “cercadinhos” na areia das praias através de aplicativo, buscando desse modo, evitar aglomerações.

[16] O Programa Bolsa Família atende às famílias que vivem em situação de pobreza e extrema-pobreza, garantindo o acesso a serviços essenciais como alimentação, saúde e educação.

[18] No seu livro Em defesa da sociedade (2010), Segurança, território e população (2008), Michel Foucault explica que o poder disciplinar é dirigido a corpos, enquanto o biopoder é compreendido enquanto o controle de indivíduos em massa.

[19] A escritora brasileira, negra, favelada e coletora de lixo, traz em seus diários os relatos viscerais do cotidiano nas periferias durante a década de 50 e 60. A escrevivência - como diria Conceição Evaristo - de Carolina Maria de Jesus demonstra o abandono que os cidadãos sofrem por seu governo. Carolina relata que o cenário brasileiro possui duas realidades: os bairros de classe alta são considerados a sala de visita, enquanto a favela seria o quarto de despejo.

[20] O constante avanço da extrema-direita na política brasileira vem causando um retrocesso em muitas áreas, dentre elas, a ciência. A distopia de Orwell (2009) se faz presente desde a manipulação de notícias e a expansão de fake news até a banalização do conhecimento científico e o corte de verbas das universidades.