A Congregação da Faculdade de Educação da Unicamp, em sua 384ª Reunião Ordinária, realizada em 26/06/2024, deliberou pela aprovação da Manifestação de repúdio ao PL 1904/2024.
A Congregação da Faculdade de Educação da Unicamp-Universidade Estadual de Campinas, vem a público manifestar enfático repúdio ao PL 1904 de 2024, que propõe criminalizar o aborto legal, garantido na Constituição Brasileira.
Esse projeto, que incide diretamente sobre o corpo das mulheres, desconsidera de forma vil os direitos das mulheres garantidos pela constituição, os princípios dos direitos humanos e da dignidade humana, além de propositalmente ignorar que parte significativa dos casos de aborto previstos em lei relacionam-se a episódios de estupro contra mulheres, meninas e jovens.
Ao desconsiderar essa estreita relação e propor pena ao aborto superior às penas por violência sexual e estupro, o projeto criminaliza e revitimiza aquelas que deveriam ser protegidas e amparadas pelas políticas públicas de saúde, assistência e segurança.
É importante ressaltar que, segundo os dados do Relatório sobre Estupros apresentado pelo IPEA em 2023, aproximadamente 75% dos casos registrados são praticados contra crianças, adolescentes e jovens. Representam 30% dos casos os estupros praticados contra crianças de 0 a 10 anos.
Entre as violências não letais, ressalta-se que o espaço domiciliar é responsável por 66% das ocorrências e, no caso das violências sexuais praticadas nos lares, 87% das vítimas são meninas (IPEAD, Atlas da Violência, 2024).
Aprovar o PL 1904/2024 representa, na prática, afrontar o Estatuto da Criança e do Adolescente e os direitos das crianças e adolescentes ao pleno desenvolvimento, segurança e afeto. A vivência do estupro e da maternidade precoce produz sofrimento e marcas psicossociais que afetam o desenvolvimento das vítimas, bem como das crianças geradas nesse contexto, resultando em dependência e vulnerabilidade, como alerta o Ministério da Saúde.
Do ponto de vista educativo, criminalizar o aborto e, pior, de forma desproporcional ao crime de estupro, representa reafirmação e reforço da cultura da violência, do patriarcalismo que incide sobre o direito e o corpo das mulheres, e ensina às jovens gerações, de forma brutal, que aos homens e meninos permitem-se ou se toleram as violências, e às mulheres e meninas restam a resignação e o silêncio.
De nada adiantam discursos pela não-violência, se na prática PLs como esse propõem violação de direitos e induzem à leniência quanto às violências sexuais e estupros. Educação exige mais que palavras, exige exemplos, ações concretas. O PL 1904/2024 é sem dúvida um mau exemplo, que deve ser rejeitado e banido da Câmara Federal e Senado, assim como os discursos que o defendem.
Que os debates em torno de temas sensíveis como esse sejam orientados pela ciência, pelos conhecimentos produzidos no campo das Ciências Humanas, da Saúde, da Assistência, da Segurança, e não por crenças, preconceitos e falsas informações.
Portanto, como instância máxima da Faculdade de Educação da Unicamp, afirmamos nosso total repúdio ao PL 1904/2024 e solicitamos seu definitivo arquivamento.
Estupro não é amor!
Criança não é mãe!
O documento aprovado na congregação pode ser acessado abaixo: