Ubirajara Alencar Rodrigues | Atualizado em 11/12/2020 - 07:58 Notícia

Drops Bibliográficos: Raios X para revelar os textos ocultos nas encadernações de livros

Por Orianne Vialo 

As novas tecnologias permitem revelar o conteúdo de certos manuscritos até o presente invisíveis a olho nu. Graças a um novo procedimento, cientistas e acadêmicos holandeses, em colaboração com Eric Kwakkel, historiador especializado em livros medievais na Universidade de Leiden (Holanda), conseguiram ler fragmentos de manuscritos que foram reutilizados para encadernar outras obras. Essa pesquisa e essas tecnologias inovadoras na área foram subvencionadas pela The Young Academy, um ramo da Academia real de artes e ciência holandesa. 

Na época, era moeda corrente «reciclar» manuscritos se servindo de suas páginas para dar maior rigidez às coberturas de novas obras. Essas «ligações» de reforço frequentemente operadas entre os séculos XV e XVIII permitiam não somente reciclar os manuscritos da Idade Média que ninguém consultava mais, mas também encadernar as páginas de outras obras mais recentes entre elas.

Tornadas obsoletas após a invenção da imprensa, essas práticas são descritas como «passageiros clandestinos de um passado distante» pelo Dr. Eric Kwakkel. «Trata-se realmente de um tesouro», continua este que também participou nas pesquisas, numa entrevista concedida ao The observer, em 05 de junho último.

A origem desse projeto? A escrita de um curto artigo, no qual Eric Kwakkel expõe ideias ou aproximações que poderiam mudar uma disciplina científica, ainda que essas não sejam ainda possíveis. «Eu falei do modo como nós poderíamos estar habilitados para acessar milhares de fragmentos de manuscritos ocultos para a determinação de outras obras. Escrevi que se poderia passar essas obras sob os raios X dos aeroportos para ver o que as coberturas ocultavam. E depois eu me lembrei que um outro membro da Young Academy tinha desenvolvido uma tecnologia permitindo olhar sob as camadas de pintura», explica o Dr. Keakkel em seu blog.

Então subvencionados pela Young Academy, Joris Dik, acadêmico da Universidade de Tecnologia de Delft, se lança com Eric Kwakkel na aventura. Juntos eles transportam o scanner de espectrometria de fluorescência de raios X à Universidade de Leiden para analisar neste local as obras. Eles chamam seu projeto de «Hidden Library» [Biblioteca Oculta] e começam a aplicar ali, em 04 de outubro de 2015, realizando os primeiros escaneamentos de obras contendo os «tesouros ocultos».

Os raios X revelam o que é invisível a olho nu

Graças à espectrometria de fluorescência de raios X (método de análise química aliando uma propriedade física da matéria, a fluorescência de raios X), os cientistas e acadêmicos puderam assim ler essas páginas até então ocultas sem, por outro lado, danificá-las, pois esses fragmentos muito preciosos podem constituir os únicos resquícios de algumas obras. Inicialmente desenvolvidas pela equipe do professor Joris Dik, essa tecnologia tinha em primeiro lugar servido para visualizar as camadas ocultas de pinturas antigas. Em 2011, eles tinham, entre outras, descoberto um autorretrato realizado por Rembrandt sob uma de suas obras.

Esta tecnologia recorrendo aos raios X permitiu assim ter uma visão muito clara dos manuscritos, sem precisar retirar a parte superior das encadernações. Conforme o professor Joris Dik, o acesso a essas «bibliotecas ocultas» permite ter acesso a indícios sobre o passado e tornar os textos ocultos visíveis, mas também legíveis.

Ele acrescentou que este procedimento foi reconhecido «também eficaz na visualização de tintas medievais ocultas. Um fino feixe de raios X é utilizado para varrer o objeto, tornando possível a detecção da presença de ferro, utilizados para produzir as tintas medievais. Estes elementos podem mesmo ser assinalados se forem cobertos por uma camada de papel e pergaminho».

O Dr. Eric Kwakkel igualmente especificou que esse projeto permitiria um avanço espetacular, além de representar um enorme potencial para todas as obras contendo as mesmas especificidades. «Seria fantástico encontrar fragmentos datando da época carolíngia, ou seja, datados do século IX ou mesmo menos. E seria ainda mais fantástico encontrar um fragmento de uma cópia muito antiga da Bíblia, que era o texto mais importante da Idade Média. Cada biblioteca possui milhares [de obras contendo, NdR] ligações, em particular aquelas possuindo as maiores coleções. Se você for à British Library ou à Bodleian Library [Oxford, NdR], elas serão milhares», acrescenta ele.

Entretanto, a técnica utilizada pelos cientistas e acadêmicos holandeses toma um tempo enorme: é preciso às vezes prever mais de 24 horas para realizar um escaneamento.

Os textos sob os textos.

Esta não é a primeira vez que a tecnologia moderna é utilizada sobre manuscritos antigos. Em abril de 2015, dois doutorandos do Departamento de língua anglo-saxônica nórdica e céltica de Cambridge tinham utilizado raios ultravioleta e um software de aperfeiçoamento de fotografias para determinar a intervenção do homem sobre uma obra medieval de 1250, retocada no século XVI. Mais tarde, em julho de 2015, um pergaminho escrito em hebraico e datando de quinze séculos pode ter seus seus segredos revelados graças à utilização de um micro scanner em três dimensões e um software de produção de imagens digital. Essas ferramentas permitiram descobrir o conteúdo do pergaminho sem o expor, a saber os oito primeiros versículos do Levítico da Bíblia, nos quais se encontram as regras dos sacrifícios rituais.

Fonte: https://www.actualitte.com/article/monde-edition/des-rayons-x-pour-reveler-les-textes-caches-dans-les-reliures-des-livres/65343

Traduzido por Ubirajara Alencar Rodrigues

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