No dia 29 de novembro de 2025, a Faculdade de Educação da Unicamp (FE-Unicamp) promoveu um roteiro cultural imersivo na capital paulista em celebração ao Mês da Consciência Negra, reunindo membros da comunidade interna da FE-Unicamp e estudantes de diferentes cursos da Unicamp. Ao longo de um dia inteiro de atividades, o grupo visitou instituições culturais de referência e participou de mediações e experiências artísticas que articularam memória, território, corpo e luta antirracista.
A iniciativa teve como objetivo promover a educação crítica e a conscientização sobre as culturas afro-brasileiras, periféricas e indígenas, explorando a memória, a resistência e as produções artísticas do povo negro em diferentes espaços da cidade. A proposta está alinhada aos valores centrais da Faculdade de Educação, fortalecendo o compromisso com a diversidade, a inclusão e a expansão do repertório cultural das futuras e futuros docentes.

O roteiro começou no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB-SP) e seguiu para o Museu das Favelas, onde o grupo conheceu as exposições “Fluxo Poético – Sérgio Vaz: Poeta da Periferia” e “Sobre Vivências”, além da mostra “Imaginação Radical: 100 anos de Frantz Fanon”. As visitas colocaram em evidência as múltiplas narrativas produzidas por artistas e coletivos periféricos, abordando tanto os impactos das desigualdades quanto a potência criativa dos territórios populares.
Para Paulo Henrique, estudante da Licenciatura Integrada em Química e Física e membro do coletivo Arvoredo Negro da Unicamp, a experiência reforçou o papel dos museus como espaços de disputa de narrativas: “Acho importante a gente conseguir circular em todos os ambientes de cultura, arquivo e memória. O museu é um lugar de memória, e o acesso à memória é importantíssimo, sobretudo para pessoas racializadas. É fundamental saber que as nossas memórias de favela também são memórias importantes, uma sabedoria que precisa ser explorada e difundida”.
Após o almoço no centro de São Paulo, o grupo seguiu para o Museu Afro Brasil Emanoel Araújo, no Parque Ibirapuera, onde participou de uma visita guiada ao acervo e às exposições “Acervo em Perspectiva”, “Popular, Populares”, “Mulika” (Maisha Maene) e “Como a Terra Respira”, de Isa do Rosário. As mediações discutiram ancestralidade, arte popular, espiritualidade, território e diásporas africanas, aproximando teoria e experiência sensível.



Larissa, estudante de Pedagogia da FE-Unicamp, destacou como a vivência dialoga diretamente com sua formação docente: “Para mim, o mais importante dentro da pedagogia é a criticidade em relação ao trabalho e ao que está sendo construído. Essas vivências são tão ou mais formativas do que uma aula. Elas ajudam a articular teoria e prática e ampliam o repertório do professor, porque a formação também se faz fora da sala de aula, na circulação pelos espaços culturais”.
Ela também ressaltou a responsabilidade institucional de criar oportunidades como essa: “Num evento facultativo, participa quem quer e quem pode. Por isso, é importante que experiências assim estejam integradas às disciplinas. A Unicamp, como universidade que se propõe a oferecer uma formação de excelência, precisa garantir que estudantes tenham acesso a esse tipo de vivência”.
Para Joyce, estudante de Dança, a imersão evidenciou o lugar central do corpo nas poéticas afro-brasileiras e periféricas: “Tratando da cultura afro-brasileira, a dança estava muito presente em todos os espaços que visitamos. No Museu das Favelas, as imagens do cotidiano – gente suada, dançando no chão, na moto – trouxeram um corpo real, uma vivência real das pessoas. Isso mudou minha visão da favela: sem romantizar a precarização, mas revelando também lazer, amor e diversidade”. Ela resume o dia como uma experiência artística integrada: “Eu consideraria esse dia inteiro como uma grande peça de arte. A arte, quando contextualizada com história, ciência e crítica, transforma nosso olhar sobre o mundo”.
As experiências de ressignificação da negritude também apareceram com força nos depoimentos. Gabrielli, estudante de Ciências Sociais, relatou como o roteiro ajuda a construir referências positivas sobre identidade racial: “A gente é educada, desde pequena, com muitos aspectos negativos ligados à experiência racial. Ter contato com experiências positivas de negritude faz com que você consiga ver além do sofrimento, humaniza. Você passa a dar outros significados para a vivência, não só o da dor”.
Isabel, que cursa licenciatura em Ciências Sociais, enfatizou a importância da mediação cultural como prática educativa: “Eu vejo as pessoas que mediaram as exposições como educadores. Seria outra visita se a gente simplesmente chegasse lá e ficasse olhando as obras. A mediação cria um fio, abre espaço para conversa e nos ajuda a entender as obras no contexto em que foram produzidas e expostas. Isso inspira muito a minha prática futura como educadora”. Ela também destacou o impacto da exposição “Imaginação Radical: 100 anos de Frantz Fanon”: “Foi muito interessante ver o pensamento do Fanon, que eu conhecia pelos livros, reinterpretado pela arte. A exposição mostra como arte e ciência podem caminhar juntas. Muitas vezes a arte está na frente, puxando o debate, e a gente corre atrás”.
O encerramento do dia foi marcado pela apresentação “Canções do Povo Negro”, realizada na marquise do Museu Afro Brasil pelo trompetista, compositor e arranjador Luan Charles e sua banda. O espetáculo traçou um percurso pela história sociopolítica da diáspora negro-africana no Brasil, utilizando a música como ferramenta de reflexão, denúncia e reivindicação contra o racismo estrutural. Para os participantes, a apresentação reforçou a ideia de que não há separação rígida entre arte, política e conhecimento – tudo se mistura na construção de outras formas de existir e de educar.



Ao longo de todo o percurso, um dos pontos mais ressaltados pelos estudantes foi justamente a atuação dos mediadores dos museus, capazes de costurar história, arte, ciência e experiência de vida. Segundo os depoimentos, essa dimensão formativa faz com que a atividade ultrapasse o caráter pontual de uma visita e tem o potencial de reverberar na prática profissional, na subjetividade e na forma como cada participante se percebe no mundo.
O roteiro cultural imersivo foi uma iniciativa da Comunicação Institucional, da Comissão de Diversidade e Inclusão e da Direção da Faculdade de Educação da Unicamp, com apoio do Edital Me Leva Dcult, da Diretoria de Cultura (Dcult) e da Pró-Reitoria de Extensão, Esporte e Cultura (PROEC) da Unicamp.
