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Profa. Nora Krawczyk | Atualizado em 20/06/2023 - 13:55 FE Publica

Palestra ministrada em comemoração dos 50 ANOS da FE 2012-2022, memórias da resistência

 

Gostaria começar parabenizando à direção pela iniciativa de nos provocar e acender nossas memorias sobre a atuação da FE nestes 50 anos: atuação na realidade brasileira, na produção da ciência e na formação de professores. E, por que não, em nossas vidas profissionais e, também pessoais. 

Me baseei para esta fala de conversas com colegas, da ajuda de Juliana, do relatório de Gestão de Dirce e Debora e das minhas pesquisas e poucos documentos que encontrei sobre a FE. Seguramente muita coisa importante não será comentado e já peço desculpas.

Quero também agradecer à comissão organizadora a oportunidade de participar nesta mesa, a última mesa desta ‘memoria’. Ao igual que quando elaboramos nossas memorias, quando a gente olha e se olha para trás, muitas lembranças e sentidos vem à tona.

Por isso, não posso deixar de começar minha fala sem fazer uma rápida referência a minha chegada na FE/Unicamp a finais da década de 80, quando ainda tínhamos no Brasil os reflexos e entusiasmo do processo de democratização do País. Recuperar essa memória agora com vocês me permite socializar a importância dos pesquisadores da FE, assim como de outras universidades, das suas produções na formação de gerações de educadores na América Latina. Também me permite compartilhar a riqueza na formação acadêmica e pessoal a possibilidade de conhecer e aprender de diferentes culturas.

Comecei meu mestrado na FLACSO, onde tive a oportunidade de construir um olhar latino-americano da educação – compreender as tendencias internacionais e regionais e ao mesmo tempo as especificidades locais, principalmente através do conhecimento da produção acadêmica de diferentes países e de seus pesquisadores. Nessa oportunidade, tive como professores a Dermeval Saviani e a Vanilda Paiva. Mas, também conheci aos professores Pedro Georgen, Maria Malta Campos, Walter García, Luiz Antônio Cunha, Guiomar Namo de Melo.

Como consequência da ditadura militar – 1976-1982, a academia argentina sofreu a perda de muitos professores/pesquisadores que hoje estão na lista dos desaparecidos e muitos outros tiveram que se exiliar. Por isso, a direção do mestrado da Flacso foi atrás de professores latino-americanos para a formação de seus estudantes. A obra de Dermeval Saviani “Educação e Democracia” foi uma referência importante na época, não só na Argentina, mas também em outros países latino-americanos, como Chile e Uruguai, chegando inclusive a ser publicada em espanhol. Sua primeira edição no Brasil data de 1983, época em que vários países da região começavam as lutas pela democratização, com forte mobilização dos docentes, carregados de expectativas e otimismo.

Essa experiência com professores estrangeiros foi importante na organização do Programa de Centros Associados da CAPES na FE entre Brasil e Argentina. Iniciou-se sob minha coordenação em 2006 e seguiu até 2014 com diferentes projetos. A participação da FE no Programa foi muito importante para a pós-graduação em educação naquela época. Incentivou outros grupos de pesquisa a participar, como foi o caso de professores do Depase, professores e estudantes tiveram a possibilidade de conhecer e debater o conhecimento produzido na Argentina e outros países latinoamericanos e ampliou a pesquisa e os referenciais teóricos na Faculdade e o olhar para culturas latino-americanas.

Cheguei ao Brasil em 1987 e à Unicamp, de alguma forma ‘da mão’ do professor Saviani. Eu já o conhecia e tinha decidido que queria fosse ele meu orientador. O debate teórico sobre a relação entre Estado, escola e sociedade e, principalmente, a compreensão da dinâmica contraditória própria do sistema capitalista junto com minha experiencia de pesquisa empírica foram essenciais na minha formação e estão presentes até hoje nas minhas preocupações e produções.

Lembro vários nomes de meus colegas de doutorado: Gilberto, josé Lombardi, Maria de Fátima, Mei. Elas vieram de São Luís do Maranhão e com elas apreendi bastante da diversidade de culturas e costumes deste País. Também quando cheguei a Campinas conheci as ‘lagartixas”, das quais depois de um susto viraram minhas amigas.

De volta à faculdade, esta vez como professora, reencontrei colegas, professores e funcionários que foram muito importantes durante minha trajetória como estudante. Vera, Nadir e Marina.

O professor Pedro Georgen e José (Zezo) Lombardi. E, a Diogenes (a minha amiga Dudu), que hoje é professora no IEL. O prof. Pedro me encontrou na cantina, muito anos mais tarde, esperando para fazer a aula didática no concurso para professor no Decise. Eu estava muito nervosa, ele segurou minha mão e me disse: “respira fundo e fala para a banca que você está nervosa, isso vai te tranquilizar”. A energia que ele me transmitiu nunca vou esquecer, nem o conselho que ele me deu.

Assim como nossa colega Neri que também soube ‘segurar minha mão’, mas esta vez por e-mail e trocando ideias, quando estava, também nervosa, me preparando para o concurso de livre-docência em 2021.

Na época que eu ingressei no doutorado na FE, encontrei o prof. Pedro também na DERI (Diretoria Executiva de Relações Internacionais) Ele era o diretor. Comento isto, para resgatar o papel da Unicamp no cenário latino-americano. A Unicamp acolheu pesquisadores e grupos de importantes censurados na Argentina tanto durante a ditadura militar brasileira como posteriormente.

O ethos democrático, inclusivo e integrador da Unicamp o senti na ‘minha própria pele’ e, na FE fica claramente demonstrado durante a década 2012-2022.

Uma ampla mobilização discente de toda a universidade durante a greve em 2016 que conquistou cotas para estudantes negros e indígenas, iniciou-se com os estudantes da FE, que ocuparam o prédio Paulo Freire, reivindicando cotas no Programa de Pósgraduação de nossa faculdade. Essa greve anuncia, a meu ver, uma mudança no comportamento de nossos estudantes, que anos anteriores buscavam uma aliança com os professores, para uma atitude mais independente, contestatária e até de oposição.

A Unicamp, aprova o sistema de cotas étnico raciais para graduação e incorpora o vestibular indígena em 2017. Na FE os primeiros estudantes indígenas ingressaram em 2019, logo aprovado o vestibular indígena pelo Consul, ainda que na época não era obrigatório fazê-lo (só passou a sê-lo em 2022). E antes mesmo do início das ações afirmativas na graduação, a FE incorpora no processo de seleção a reserva de vagas para pretos, pardos e indígenas no processo de seleção da pós-graduação. 

A FE sempre buscou construir fortes vínculos com as redes públicas de ensino básico: através de encontros de reflexão coletiva, investimento em pesquisas e sua divulgação, e com projetos de formação de professores para educação básica e de pesquisadores. Uma iniciativa importante nesse sentido foi em 2017, quando começa na FE o Mestrado Profissional em Educação Escolar, com o intuito de uma maior aproximação dos professores da rede pública à universidade e da universidade à escola pública.

Foi durante o I Seminário de Pesquisa do Mestrado Profissional (2018), em meio aos ataques públicos endereçados ao Prof. Paulo Freire, - mas sem dúvida buscando atingir à escola pública, à democracia brasileira e demonizando a Pedagogia Crítica -, um movimento conservador defendeu a revogação do título de Patrono da Educação Brasileira que lhe foi concedido em 2012 através do projeto de Lei 12.612, de autoria da deputada federal Luiza Erundina. Os estudantes do Mestrado Profissional, juntamente com os docentes, num ato de resistência, elaboraram um documento propondo a nomeação do Prédio Central da FE como Professor Paulo Freire.

Foi uma época de muita discussão na FE sobre qualquer questão que pudesse atingir à escola pública. Uma delas, que teve a importante mobilização dos estudantes e que culminou com a oposição da Congregação, foi a participação da faculdade em um projeto liderado pelo Instituto Unibanco.

Mas, como todos sabemos foram anos difíceis para o País e para educação. Foi um período de profundas mudanças políticas, econômicas e sociais em nosso país, e seu impacto na área da educação, na dinâmica da Universidade e na Faculdade de Educação. Foi uma década que progressivamente o Brasil foi cercado por grupos de neoliberais, conservadores e fascistas que promoveram o sucateamento da educação pública brasileira, da universidade pública, da liberdade de expressão e ataque à ciência e à tecnologia.

Jornadas de Junho/2013 - Não era só por 20 centavos...

Estávamos no meio da Operação Lavajato, iniciada um ano antes, quando eclodiram as manifestações em São Paulo contra o aumento das passagens de ônibus, manifestações que logo foram capturadas pela direita. As duas coisas não podem ser dissociadas, sobretudo quando se pensa no rumo que tomaram esses protestos e como viriam a se espalhar pelo país.

De fato, a operação comandada a partir de Curitiba e com ampla cobertura da mídia hegemônica, marcou profundamente o País e suas consequências ainda estarão visíveis por anos. Aquilo que era uma ofensiva judicial contra a corrupção, aprofundou a criminalização da política e praticamente destruiu a indústria da construção pesada brasileira, ceifando alguns milhões de empregos e reduzindo a arrecadação de impostos em bilhões de reais.

Mas pouco a pouco foram surgindo mídias alternativas, fazendo as vezes de contraponto. Blogs, portais, grupos de WhatsApp começam a denunciar o que realmente estava acontecendo. 

Logo depois, o Movimento Brasil Livre toma força e dele nasce o Movimento Unicamp Livre. Ambos são movimentos neoliberais com uma presença marcante de jovens, que ao longo desta década foram se afirmando e filtrando em diferentes espaços.

Preciso aqui dar um salto no tempo para lembrar que no ano passado, 2022, foi organizada a vinda de Lula, na época pré-candidato à presidência, para oferecer uma Aula Magna na Unicamp, o que aconteceu no Teatro de Arena lotado de estudantes e professores. O convite foi uma forma de expressar o apoio da Unicamp à retomada da democracia no Brasil e fortalecimento da luta que na época estava sendo travada no âmbito de eleições polarizadas entre os conservadores e os ‘democráticos’. O Movimento Unicamp Livre acusou o evento como uma ação de ‘extrema esquerda’ e de não permitir falar o vereador paulistano Fernando Holiday, filiado aos Republicanos e então coordenador nacional do MBL.

Logo, depois numa clara manifestação contraria, se falou que o MBL do qual o Movimento Unicamp Libre é parte, convidaria Moro, então pré-candidato do Partido PODEMOS. Sinceramente não sei se acabou acontecendo ou teve tão pouca repercussão que nem se soube muito sobre isso.

Em 2016 assume por primeira vez a direção a Faculdade duas mulheres: as professoras Dirce Zan e Debora Massa. É, como elas mesmas manifestaram formaram uma equipe de gestão feminina. Raquel foi nomeada secretária da Diretoria e Luciana coordenadora Técnica da Unidade.

Logo depois, também em 2016, um golpe parlamentar jurídico-mediático destitui à presidenta Dilma Rousseff, escolhida democraticamente. Assume a presidência o vice, Michel Temer, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

O Brasil começa a viver um pesadelo que nunca imaginamos possível e que ainda está difícil de compreender. Após 15 anos de mobilizações em torno à consolidação de um sistema de democrático e a conquista de direitos sociais historicamente negados à maioria da população, em 2016, novamente nossa democracia foi atacada com a destituição da presidente Dilma. A partir daí, o País vive um forte processo regressivo econômico, social e político.

Desde então, passamos por muitas mudanças, lutas e desafios em defesa da escola e Universidade Pública. Uma iniciativa pioneira de colegas do Instituto de Ciências Políticas da UNB, de oferecer uma disciplina sobre democracia brasileira contemporânea, abrangendo o período que antecede a deposição de Dilma Rousseff e seus desdobramentos, foi criminalizada e judicializada pelo governo Temer.

Em defesa da autonomia universitária e produção e difusão do saber, função inerente às universidades, docentes de várias universidades brasileiras, praticamente de todas as regiões do País, promoveram cursos e seminários em solidariedade aos professores da UNB.

Sem dúvida, a faculdade não podia (nem queria) ficar alheia ao que estava acontecendo no País. Era urgente nossa manifestação de solidariedade. Os professores da casa se engajaram prontamente e formatamos coletivamente um curso livre na Faculdade de Educação, coordenado por mim junto com o prof. Lombardi. A proposta foi apresentada 6 e aprovada na Congregação da Faculdade de Educação que, mais uma vez em sua curta, porém vigorosa história, se posicionava contra o arbítrio e em defesa da autonomia universitária e da liberdade de cátedra.

O curso livre “O Golpe de 2016 e a Educação”, foi oferecido ao longo do primeiro semestre de 2018 e buscou discutir abertamente e coletivamente a seguinte pergunta: “Quais os efeitos para a educação brasileira do golpichment jurídico-parlamentarmidiático de 2016, contra a presidenta Dilma Rousseff e seus desdobramentos seguintes?”. Para tanto, através encontros mensais, o tema foi abordado a partir da nova configuração das relações de poder no mundo globalizado: analisaram-se, de uma perspectiva histórica, a constituição da democracia no Brasil e seus percalços; os retrocessos nos direitos trabalhistas e o processo de sucateamento da educação; e a ascensão do pensamento conservador e as forças que deflagraram o golpe de 2016 e suas possibilidades de resistência. Participaram muitos professores da casa: não posso nomear um a um com receio de poder esquecer alguém, e tivemos também alguns convidados.

As palestras foram base para um livro organizado pelo Zezo e por mim. No prefácio escrevemos: “Mais do que reagir às ameaças e reafirmar a autonomia universitária, o livro aqui apresentado, tal como o curso que lhe deu origem, tem por objetivo refletir sobre o processo político recente do Brasil, socializando as elaborações conjunturais dos pesquisadores que toparam o desafio de participar do curso. Em última instância é defender a função fundamental da universidade, tão atacada nos últimos tempos: pesquisar de modo livre, crítico e independente, socializando os conhecimentos e reflexões produzidas através de um ensino público, gratuito, competente e socialmente referenciado. Em síntese, não é possível pensar a universidade, como uma instituição historicamente produzida, sem que exista autonomia e liberdade para pensar, debater e confrontar diferentes visões, métodos e teorias, sem as quais nenhum conhecimento novo se produz, nenhuma revolução filosófica, científica e artística seria possível”.

Outra iniciativa no mesmo sentido, foram os seminários organizados anualmente pelas profas. Debora Mazza e Nima “Educação, Golpe e Ditadura”, do qual participaram o jornalista Barnabé Medeiros, entre outros pesquisadores desse tema. Desde seu primeiro encontro, em 2016, buscou-se, como afirmaram as organizadoras, analisar de uma perspectiva crítica e reflexiva o fato de que "golpe" é parte das táticas utilizadas pelas elites econômicas e políticas, nacionais e internacionais, em diferentes tempos-espaços, tendo em vista, dentre outras, interromper o aprofundamento da participação popular.

Em 2017 no meio da luta pela defesa da democracia e da educação pública, a FE completou 45 anos de sua criação. Foram realizados uma série de eventos acadêmicos que aprofundaram o debate sobre a educação brasileira no contexto de crise política e econômica que estávamos vivendo no Brasil. Dessa forma, a FE compartilhou com a comunidade universitária com os as redes de ensino a produção de nossas pesquisas e reflexões.

No marco dessas iniciativas, tive o enorme prazer de ser convidada pela direção para organizar a atividade de encerramento do ano comemorativo dos 45 anos da FE. Tratase do Congresso Internacional Escola Pública: tempos difíceis, mas não impossíveis, que contou com a contribuição de importantes pesquisadores nacionais e internacionais que, de diferentes aportes teóricos, assumiram o desafio intelectual de 7 rebater as falácias que sustentavam e ainda sustentam hoje o ataque cerrado à escola pública, apresentando através de suas pesquisas, os reais motivos e os problemas fundamentais da educação contemporânea. Posteriormente publicamos um livro com o mesmo nome do Congresso.

Queríamos regatar a positividade do espaço público, como espaço democrático, de luta e resistência. Acredito sinceramente que conseguimos. Realizado em meio às ocupações de escolas, em protesto contra o fechamento de unidades escolares em vários Estados, o Congresso contou com uma presença emblemática. Estou falando da então líder das ocupações no Paraná, Ana Júlia Ribeiro, que hoje é estudante de Direito em Curitiba. Ela foi eleita deputada estadual e este ano passou a integrar a bancada do PT na Assembleia Legislativa de seu Estado.

Ao longo dos 3 dias no evento, ficou clara a convicção dos pesquisadores, educadores, gestores e estudantes, que somando mais de 700 participantes, e da comunidade da FE de que a escola e a universidade pública são espaços estratégicos de formação de valores e são fundamentais no desenvolvimento de uma sociedade democrática e independente. E, que é nosso dever resistir à destruição da escola pública, pois ela, apesar de todas as suas contradições, inerentes ao sistema no qual está inserida, representa uma conquista da luta de várias gerações de educadores, trabalhadores e lideranças populares.

2018 – Bolsonaro eleito a extrema direita chega ao poder

Voltando ao Brasil, falemos das eleições de 2018. Possivelmente foi nelas que se consolidou a era dos fake News, promovida pela manipulação das redes sociais. Foi nesse pleito também que tivemos uma aliança estratégica entre a religiosidade ultraconservadora, o lavajatismo e militares golpistas.

Tivemos também importantes movimentos de resistência, entre os quais a campanha do “Ele não”. Lembro que às vésperas do primeiro turno e estando Lula preso, eu estava em Curitiba onde participei de uma passeata contra Bolsonaro com milhares e milhares de pessoas, manifestação que nesse mesmo dia se repetia nas principais cidades do Brasil. No dia seguinte houve por lá uma carreta bolsonarista que igualmente se repetia pelo país.

A mídia tratava os dois eventos com o mesmo peso, enquanto dava as costas às fake news, entre às quais viralizou uma montagem fotográfica de famílias armadas com bíblias sendo hostilizadas por mulheres com os seios à mostra. Por essa época também saiu o famoso editorial do Estadão classificando a disputa entre Haddad e Bolsonaro como “uma escolha difícil”.

Os primeiros 100 dias do governo Bolsonaro já deixaram claro o propósito de desmonte da educação em todos seus níveis, da Ciência e Tecnologia, e das bolsas de estudo no País e no exterior, que vieram nos anos posteriores. Cabe lembrar a escola domiciliar e as escolas cívico-militares, alterando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

O movimento Escola sem Partido, movimento também de extrema-direita e fundamentalista que tinha sido criado em 2004, ganha notoriedade midiática em 2015, quando começa a apresentar projetos de lei de ataque à escola pública, em inúmeras câmaras municipais e assembleias legislativas, bem como no Congresso Nacional. Nos 8 anos seguintes, no forte clima neoconservador dos costumes, promovido sistematicamente pelo governo Bolsonaro e seus aliados, o Movimento vai cooptando as famílias produzindo um clima de denúncias e medo nas escolas.

Os/as pesquisadores da FE se manifestaram criticamente de diferentes formas. Assumimos a posição pública de resistência, através de faixas, cartazes, eventos, produções académicas, manifestos de estudantes e professores e notas públicas encaminhadas à câmara de vereadores do município de Campinas – SP.

O presidente e seus ministros resolveram encarar o que eles chamaram de “guerra cultural”. Estávamos sem dúvida vivendo uma clara disputa política e cultural no País e um forte enfrentamento ao caráter cultural e científico da escola pública, que lamentavelmente não acabou.

A crise global do neoliberalismo no século XXI serviu como uma luva para difundir e fortalecer o movimento conservador pelo mundo. O avanço do pensamento conservador e neoliberal na disputa pela escola pública se expressa em iniciativas como o projeto de educação domiciliar, de escola sem partido, de escolas cívico militares e na reforma do ensino médio, que hoje tem levado estudantes e professores para as ruas.

A pandemia do coronavírus chega ao Brasil e se alastra pelo País de forma descontrolada. Chegou no meio de um conjunto de reformas regressivas que deixaram ainda mais vulneráveis trabalhadores e grupos sociais historicamente abandonados pelo poder público. A situação do País se agudiza à medida que o Presidente da República, Jair Bolsonaro, atua na negação da gravidade da pandemia e se omite na implantação de medidas capazes de amenizar a disseminação do vírus e o sofrimento da população, causando ainda maior transtorno para o País e insegurança para qualquer medida que as instituições educativas possam tomar. Recrudesceram as tensões e os conflitos que já estavam presentes no cenário educacional brasileiro evidenciando e aprofundando as condições sociais preexistentes e contribuindo para o aumento da desigualdade educacional e social. O confinamento que levou para dentro das residências o ensino remoto em todos os níveis do sistema educacional resultou na aceleração dos processos de mercadorização da educação, de intensificação do trabalho do professor e responsabilização das famílias.

Toda essa situação tornou mais visíveis as consequências das políticas neoliberais e, de alguma forma, nos alertou sobre os combates que nos esperava na educação póspandemia. Combates que hoje estamos enfrentando na FE através de nossas pesquisas, publicações, encontros, debates e mobilizações junto com nossos estudantes.

A Unicamp teve uma ação exemplar no cuidado de seus estudantes, professores e funcionários durante a pandemia. O fechamento do prédio e a necessidade de isolamento social nos pegou de surpresa. Não concordávamos com o discurso oficial do governo de São Paulo de “a educação não pode parar”, que tanto afetou os docentes, crianças, jovens e suas famílias gerando angústias e acentuando dificuldades. Mas, tínhamos o compromisso de dar uma resposta a nossos estudantes. Mobilizamos todos os esforços possíveis (e impossíveis) para criar espaços virtuais de aprendizagem e acolhedores, respeitando as situações particulares e tentando contornar as dificuldades coletivas e individuais que essa situação sanitária, política e social estava produzindo. 

Foram anos duros e de forte indignação

O discurso político alarmista e maniqueísta de fracasso do Estado na condução da educação básica e universitária é legitimado numa produção de conhecimento dominada pelo economicismo e pela supremacia dos interesses privados. O Estado tem sido acusado de ser o responsável por todos os ‘males’ da sociedade atual.

A destruição dos espaços públicos e a apropriação da educação escolar por interesses particulares – ideológicos e econômicos – são dimensões do processo regressivo das conquistas sociais adquiridas ao longo de décadas e que estamos vendo serem destruídas, mas não sem resistências e lutas sociais.

O ataque à escola pública não é mais nem menos que uma investida na ignorância de nossa juventude, principalmente da juventude trabalhadora, e um ataque a nossa soberania nacional.

Chegamos a 2022/2023, com um País em busca de recuperação da sua democracia, mas carregado de contradições em todos os âmbitos: político, social, econômico e, por tanto político educacional. A reforma do ensino médio nos encontra numa nova luta coletiva pelo “revoga”. E, as últimas decisões do Congresso nos obriga a defender os direitos das comunidades indígenas historicamente conquistados.

Dedico esta fala a todos meus colegas e estudantes com os quais compartir diferentes momentos de aprendizagem e aos que lutam por uma sociedade justa e igualitária, a mesma dedicatória do Livro do O Golpe de 2016 e a Educação.

Feliz aniversário, Faculdade de Educação